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Xadrez: O Sacrifício.

Xadrez: O Sacrifício.

Ulquir
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O Sacrifício é uma jogada tática, em que um jogador, propositalmente se coloca em posição de desvantagem material, com o intuito de conseguir, indiretamente, um benefício de natureza estratégica, posicional ou material. Dissecando este conceito, tem-se que: a) o jogador que voluntariamente conceder material ao seu adversário, tem que ficar em desvantagem, caso assim não ocorra, a jogada não poderá ser chamada de sacrifício pois não haverá a configuração de um risco; b) o benefício fruto do sacrifício não pode ser direto, imediato à jogada, uma vez que nesse caso ter-se-á uma troca; c) o benefício estratégico, posicional ou material tem que ser possível de ser conquistado através do sacrifício, e apenas através do mesmo, caso contrário tem-se um erro, um "blunder" - o sacrifício necessariamente precisa ser positivo para quem o faz.

A possibilidade de ganhos através da perda de material demonstra claramente que o jogo de xadrez não depende, principalmente, de observações matemáticas, mas sim, por outro lado, de capacidade imaginativa e criatividade. De fato, essas virtudes subestimadas, imaginação e criatividade, são as principais armas apresentadas pelos grandes mestres xadrezistas.

Qualquer peça, com exceção óbvia do rei, pode ser sacrificada. Quanto maior o valor da peça a ser entregue, maior a relevância do sacrifício. Rudolf Spielmann, famoso enxadrista judeu austríaco, escritor do livro "The Art of Sacrifice in Chess", divide o sacrifício em dois tipos adversos, a saber: sacrifício real e sacrifício simulado. No sacrifício real, o jogador se sujeita a passar várias rodadas em desvantagem material, em compensação ele consegue vantagens estratégicas que terá que fazer uso para vencer o jogo, ou será derrotado em decorrência da inferioridade material. O sacrifício simulado é aquele em que o benefício pelo ato heróico vem a galope, geralmente em até cinco rodadas seguintes. Este tipo pode ser usado para conseguir material, forçar o caminho até um xeque-mate ou empedir a derrota iminente, obrigando a ocorrência de um afogamento (stalemate) ou de um xeque perpétuo.

Em um artigo chamado "The psichology of the sacrifice" (A psicologia do sacrifício) presente aqui mesmo no chess.com, eu encontrei algumas ideias bem interessantes sobre como o sacrifício altera a mentalidade dos jogadores durante a partida. Basicamente, sempre que há a entrega de força material com um propósito superior, altera-se a expectativa que ambos os xadrezistas depositam do jogo. Veja alguns exemplos:
O sacrificador consegue um impulso extra: O jogador que pratica o sacrifício tem a sua auto-estima elevada e se sente tal qual um gênio jogando a "partida do século". Esse jogador faz um investimento para o fututo e dessa forma se sente no controle do jogo. Apesar de ser positivo, esse impulso pode levar o enxadrista a cometer erros por excesso de confiança.
O sacrificador pode sentir que tem que se apressar: Xadrezistas em desvantagem material geralmente sentem pânico, por acreditarem que precisam, o mais rápido possível, alterar essa condição desfavorável. Jogar energiticamente pode parecer bom em vários aspectos, mas há cenários em que é simplesmente irrelevante e redundante.
O adversário sente que perdeu o controle do jogo: A sensação de estar sendo usado para a concretização da estratégia de outrem nunca é agradável, e essa sensação é notavelmente perceptível no jogador adversário do sacrificador. Um dos jogadores está jogando a "partida do século" enquanto o outro não passa de um espectador, um elemento passivo incapaz de reverter a situação atual do jogo. Os enxadristas agressivos são os que perdem o controle sobre sua capacidade intelectual com maior frequência, após um sacrifício ser feito contra eles.
"Parece-me que nos temos enganado vastamente nessa questão de Vida e Morte. Parece-me que o que chamam de minha sombra aqui na terra é minha verdadeira substância. Parece-me que, ao considerar as coisas espirituais, aproximamo-nos muito de ostras que observam o sol através da água, a pensar que essa água espessa é a parte mais tênue do ar. Parece-me que meu corpo é apenas a borra do meu ser melhor. Na verdade, leve meu corpo quem quiser, levem-no, eu digo, ele não é o que sou. Portanto três vivas para Nantuckt! E venham quando vierem um barco e um corpo rebentados, pois nem o próprio Jove pode rebentar minha alma."